A MINHA PAIXÃO ou quase
com o coração acelerado ainda e a pele da perna marcada do arrepio escrevo agora, pois preciso voltar a dormir. a minha paixão aconteceu! eu tinha gritado e pedido isso de alguma forma aqui um dia desses, recente, e em tudo desejo metamorfose, mas se eu não conhecesse a paixão da G.H. eu teria, ao contrário dela, me esquecido para sempre das leis e dos regulamentos. parece profecia, sonho, eu mesma desconfiei da veracidade do que estava vendo por muitas vezes, até que deixei como prova de que era real o corpo da barata que matei no escritório da minha casa. algo de dimensão bíblica acontecera com G.H enquanto comigo apenas o inevitável, mas coincidente. eu nem sei como e porque levantei da cama com pretexto de fazer xixi e não era uma vontade urgente como a de sempre e que faz a gente acordar. eu testei pra ver se valeria ir até o banheiro, apertei a barriga com a sua própria força e quase não tinha o que sair, mas tinha um incômodo e decidi. abri a porta do meu quarto e como uma piada lá estava eu tão cansada diante de uma enorme barata tb já tão cansada e vagarosa, era uma barata grande e velha como a que Clarice Lispector descreve no livro que leio e releio com esforço pra não perder o regulamento. e foi uma sensação de déjà vu, de sei lá. o pavor e o nojo não ficaram em primeiro plano e é claro que eu paralisei durante um tempo, mas como tá escrito no livro sagrado da Paixão Segundo G.H, na vida é preciso ter a coragem de ir como um sonâmbulo então eu fui e busquei o primeiro sapato que vi. antes de atacar a barata, observei que a antena esquerda fina e longa se mexia como orelha de cachorro que percebe movimento por perto, parei de novo com o corpo todo doendo por ter que passar por isso. respirei fundo, abafei o enjôo e mirei, mas ela começa a andar, toda errada, errando as patas, estranha e foi quando tive certeza da semelhança não só entre as baratas, mas entre os destinos. tive a sensação então de uma super realidade acontecendo em tempo instantâneo e potente. senti um pouco de medo, pensei em como seria a minha relação com aquela barata e queria que fosse a mais breve possível! fui atrás dela com calma e então taquei o sapato mais uma vez, ela escapou e andou mais um pouco, por todo o corredor que sai do meu quarto até o escritório, como uma via crucis e eu era a que apedrejava, sem querer cumprindo o meu papel. e de novo taco o sapato e ela escapa, não soube esmagá-la com o sapato na mão, seria muito nojento, escutei o barulho dela se quebrando toda molhada com sua massa de dentro indo pra fora, não! ela parou e ficou, acho que quis se fingir de morta, elas são muitos mais espertas do que eu pensava, e a própria G.H. não tivera a chance de perceber isso. taquei de novo somente pra imobilizá- la e ganhar tempo de pegar o inseticida. esse foi um jogo sujo entre nós e era a única maneira de eu me livrar dela e ela de se salvar. corri e voltei implacável dando muitos tiros e ela resistente de barriga pra cima ao lado do sapato derrotado tb com a sola pro alto, ela me lembrou o Gregor Sansa quando acorda e não consegue sair da cama esperniando as patas, lutando pela vida. ela então se vingou de mim nessa hora, pois era de um horror quase insuportável o que aquele movimento desesperado causou em mim, eu toda contorcida junto com ela, arrepiada e dramática, acompanhei os momentos finais da barata que relutava e eu era a única a ter esperança de que ela ia sim morrer. uma agonia, eu tive pena e nojo, que coisa! lentamente ela foi perdendo a força e então nem tive mais coragem pra nada, já era suficiente pra mim! todos aqueles sustos e o que vem depois... deixei ela lá como se pudesse se desmaterializar, não toquei, nem pensei em tocar. quase embarquei na mesma viagem de G.H. ao deserto e ao inferno, mas ela me avisou de tudo, e me guiou como uma memória minha, de coisa que eu mesma aprendi sozinha na vida e então soube como viver melhor o que me acontecia de novo.
com o coração acelerado ainda e a pele da perna marcada do arrepio escrevo agora, pois preciso voltar a dormir. a minha paixão aconteceu! eu tinha gritado e pedido isso de alguma forma aqui um dia desses, recente, e em tudo desejo metamorfose, mas se eu não conhecesse a paixão da G.H. eu teria, ao contrário dela, me esquecido para sempre das leis e dos regulamentos. parece profecia, sonho, eu mesma desconfiei da veracidade do que estava vendo por muitas vezes, até que deixei como prova de que era real o corpo da barata que matei no escritório da minha casa. algo de dimensão bíblica acontecera com G.H enquanto comigo apenas o inevitável, mas coincidente. eu nem sei como e porque levantei da cama com pretexto de fazer xixi e não era uma vontade urgente como a de sempre e que faz a gente acordar. eu testei pra ver se valeria ir até o banheiro, apertei a barriga com a sua própria força e quase não tinha o que sair, mas tinha um incômodo e decidi. abri a porta do meu quarto e como uma piada lá estava eu tão cansada diante de uma enorme barata tb já tão cansada e vagarosa, era uma barata grande e velha como a que Clarice Lispector descreve no livro que leio e releio com esforço pra não perder o regulamento. e foi uma sensação de déjà vu, de sei lá. o pavor e o nojo não ficaram em primeiro plano e é claro que eu paralisei durante um tempo, mas como tá escrito no livro sagrado da Paixão Segundo G.H, na vida é preciso ter a coragem de ir como um sonâmbulo então eu fui e busquei o primeiro sapato que vi. antes de atacar a barata, observei que a antena esquerda fina e longa se mexia como orelha de cachorro que percebe movimento por perto, parei de novo com o corpo todo doendo por ter que passar por isso. respirei fundo, abafei o enjôo e mirei, mas ela começa a andar, toda errada, errando as patas, estranha e foi quando tive certeza da semelhança não só entre as baratas, mas entre os destinos. tive a sensação então de uma super realidade acontecendo em tempo instantâneo e potente. senti um pouco de medo, pensei em como seria a minha relação com aquela barata e queria que fosse a mais breve possível! fui atrás dela com calma e então taquei o sapato mais uma vez, ela escapou e andou mais um pouco, por todo o corredor que sai do meu quarto até o escritório, como uma via crucis e eu era a que apedrejava, sem querer cumprindo o meu papel. e de novo taco o sapato e ela escapa, não soube esmagá-la com o sapato na mão, seria muito nojento, escutei o barulho dela se quebrando toda molhada com sua massa de dentro indo pra fora, não! ela parou e ficou, acho que quis se fingir de morta, elas são muitos mais espertas do que eu pensava, e a própria G.H. não tivera a chance de perceber isso. taquei de novo somente pra imobilizá- la e ganhar tempo de pegar o inseticida. esse foi um jogo sujo entre nós e era a única maneira de eu me livrar dela e ela de se salvar. corri e voltei implacável dando muitos tiros e ela resistente de barriga pra cima ao lado do sapato derrotado tb com a sola pro alto, ela me lembrou o Gregor Sansa quando acorda e não consegue sair da cama esperniando as patas, lutando pela vida. ela então se vingou de mim nessa hora, pois era de um horror quase insuportável o que aquele movimento desesperado causou em mim, eu toda contorcida junto com ela, arrepiada e dramática, acompanhei os momentos finais da barata que relutava e eu era a única a ter esperança de que ela ia sim morrer. uma agonia, eu tive pena e nojo, que coisa! lentamente ela foi perdendo a força e então nem tive mais coragem pra nada, já era suficiente pra mim! todos aqueles sustos e o que vem depois... deixei ela lá como se pudesse se desmaterializar, não toquei, nem pensei em tocar. quase embarquei na mesma viagem de G.H. ao deserto e ao inferno, mas ela me avisou de tudo, e me guiou como uma memória minha, de coisa que eu mesma aprendi sozinha na vida e então soube como viver melhor o que me acontecia de novo.
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